ANÁLISES, TEXTOS RELACIONADOS AO MUNDO DAS PESQUISAS E PRINCIPAIS TRABALHOS REALIZADOS.

quinta-feira, 24 de março de 2011

PESQUISA COM OS CATADORES DE RECICLÁVEIS DO CENTRO E ADJACÊNCIAS DE CAMPINAS RECEBE DESTAQUE NO JORNAL CORREIO POPULAR DE CAMPINAS




Caderno Cidades: Coleta informal sustenta mil famílias.


Pesquisa feita pela Prefeitura de Campinas indica que maioria dos catadores ganha até R$ 350




Rogério VerzignasseDA AGÊNCIA ANHANGUERArogerio@rac.com.br


Eles são vistos em todo canto da cidade. Homens e mulheres de meia idade, puxando carrinhos cheios de lixo reciclável. O desemprego levou para as ruas quase mil campineiros, que sobrevivem basicamente do que coletam nas calçadas. Papel, metal, lixo, plástico. Uma gente que trabalha duro, do nascer ao pôr do sol, arrecadando e vendendo o material (quase sempre a preços irrisórios) em depósitos e ferros-velhos.
Cerca de 54% dos catadores informais ganham, no máximo, R$ 350,00 por mês. Mas é com esse trabalho honesto, embora pessimamente remunerado, que essas pessoas alimentam as crianças e pagam as contas.A maior parte dos catadores tem entre 39 e 60 anos de idade. E quase metade deles mora em Campinas há mais de dez anos. Ou seja, as pessoas fizeram a opção pela coleta do lixo porque foram alijadas do mercado de trabalho. Precisam da atividade para manter a casa. Também é chocante saber que 4,5% dos catadores são pessoas com mais de 70 anos.Estes números são revelados por uma inédita pesquisa de campo, planejada e executada por gente da Secretaria Municipal de Trabalho e Renda. As informações, tabuladas pelos técnicos Flávio Luiz Sartori e Eliete Bueno Sampaio, serão disponibilizadas ao longo da semana no site da Prefeitura (confira nesta página quadro com os resultados mais importes).


Pela primeira vez, Campinas conta com dados sobre o universo informal de catadores. Antes das entrevistas (feitas entre os meses julho e agosto), a pasta tinha só informações sobre a coleta regulamentada: cerca de 350 campineiros vinculados a uma das 15 cooperativas regulares de material reciclável. Entidades que pagam a chefes de família uma renda mensal de R$ 500,00 até o teto de R$ 800,00. São salários de quem contribui com a limpeza urbana e ajuda a aumentar a vida útil dos aterros. Os dados tabulados agora comprovam, no entanto, que a sociedade só tem controle sobre um terço da massa que depende da atividade. Dois terços são informais. Há motivos de sobra para que a Prefeitura modernize o setor e garanta vida digna a milhares de campineiros dependentes do trabalho informal, que objetivamente nem contam contam com benefícios sociais. “À margem da sociedade organizada, estes campineiros não contam com o acesso a serviços públicos essenciais, nem a direitos trabalhistas”, afirma Sebastião Arcanjo, o “Tiãozinho”, titular da pasta responsável pela pesquisa. Com os elementos revelados nos questionários, o secretário pretende colaborar, ao longo de 2010, com a implantação da nova política municipal de reciclagem. Até hoje, exatamente por não ter controle da situação, Campinas acumula resultados inexpressivos no segmento. A coleta de resíduos recicláveis (contando cooperativas, sistema público de coleta e atividade informal) é de 8% do lixo produzido pela cidade a cada dia, algo em torno de 900 toneladas. A cidade perde longe de outros centros urbanos importantes. Em São José dos Campos (SP) e Londrina (PR), por exemplo, a coleta seletiva contempla entre 15 e 25% de tudo que chega aos aterros. “Precisamos aprimorar o setor, incentivar a disposição correta do resíduo reciclável, criar formas eficientes de coleta e destinação do material”, fala Tiãozinho. Medidas As mudanças emergenciais propostas no
Programa Municipal de Economia Solidária incluem o cadastramento dos coletores em cooperativas regulamentadas, que vão produzir mais, contando com equipamentos modernos e mão de obra mais qualificada. Com repasses prometidos pela Política Nacional dos Resíduos Sólidos, Campinas espera investir R$ 15 milhões na ampliação de barrações, compra de máquinas especiais e treinamento de pessoal. Os relatórios sobre as atividades de 15 cooperativas precisam ser analisados e aprovados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Até a conclusão do processo, a Prefeitura pretende ordenar a coleta com a criação de postos fixos de transbordo, por todas as macrozonas da cidade. O cidadão interessado em colaborar vai saber exatamente onde ele pode depositar os resíduos.Mas a política municipal ainda contempla um projeto muito ambicioso: transformar cooperativas em usinas para o processamento completo do material coletado. Ao invés de fornecer matéria-prima para a indústria, o próprio setor vai fabricar, vender, lucrar. "Sem atravessadores, a atividade vai garantir rendimentos maiores" , aposta Tiãozinho.


SAIBA MAIS:
Os dados detalhados da pesquisa devem ser veiculado ao longo da semana no link da Secretaria Municipal de Trabalho e Renda, no site www.campinas.sp.gov.br Tereza, 56 anos, mantém a casa com R$ 250 por mêsCasada e com 2 filhos, ela passa o dia percorrendo ruas de CampinasDona Tereza Silva tem o perfil exato do catador informal de lixo reciclável. Aos 56 anos, casada e mãe de dois filhos ainda solteiros, ela mora em um barraco modesto da Rua Moscou. Pagou R$ 100,00 por um carrinho e anda pela cidade à procura do material.Como suspende a coleta para fazer almoço e lavar a roupa, não consegue ganhar mais de R$ 250,00 mensais. Apesar disso, a renda é muito importante. Como o marido (o pedreiro Aparecido) anda doente e se afastou das obras, o dinheiro ajuda a colocar comida na mesa. Ela gostaria, sim, de ter outra profissão. Diz que se daria bem como diarista. Mas há quatro anos, quando faltou trabalho, ela partiu para a coleta e nunca mais saiu. “Eu ganho pouco, eu sei, mas vivo do trabalho honesto”, diz. Nem sempre, no entanto, a dignidade da atividade é reconhecida pelos campineiros. Que o diga José Lindomar Pereira da Silva, um homem de 38 anos, solteiro, que mora em uma pensão do bairro San Martin. Em 1992, ele abandonou a pequena Canto do Buriti (PI) e partiu para o Estado de São Paulo, onde já moravam seus irmãos. O sonho do rapaz era trabalhar como operário de fábrica. Mas ele apelou para a coleta seletiva quando o dinheiro acabou. “Eu precisava sobreviver. Montei meu carrinho e passei a viver disso. Consigo retirar R$ 30 por dia, entregando o material em um depósito do Jardim Proença. A única coisa ruim é ser humilhado pelos motoristas, que tiram fina do carrinho. Os carrinheiros são motivos de piada”, fala. Para ser respeitado, Lindomar adotou uma estratégia. Faz sempre o mesmo roteiro, e arrecada o material das mesmas casas e estabelecimentos. “Quando as pessoas te conhecem, te tratam melhor”, fala.
Organização A qualidade de vida é muito maior no caso dos catadores que integram cooperativas de reciclagem. Uma das mais tradicionais dela, a Aliança/São Judas Tadeu, foi fundada há 11 anos no distrito sumareense do Matão, e ficou famosa por arrecadar o material descartado por moradores do Cambuí. Antes, os funcionários recolhiam basicamente o que era amontoado em uma praça da Rua Coronel Silva Teles. Hoje, o grupo tem um caminhão para a coleta, que permanece estacionado perto da igreja do bairro. Além disso, a coleta também é feita com carrinhos em condomínios residenciais. Nos galpões do Matão (que tomam 750 metros quadrados), 31 pessoas trabalham. Todo o material recolhido é prensado e embalado para revenda posterior. Filomena de Oliveira, de 50 anos, conta que recebe salário de R$ 500,00 mensais por ali. Viúva, ela precisa do dinheiro para alimentar os filhos. Ela mora no campineiro Residencial Olímpia. Antes, empurrando o carrinho e fazendo coleta informal, ela se cansou de ser humilhada. Era maltratada nas ruas e recebia migalhas pelo material que arrecadava. Ali, trabalhando em lugar organizado, ela se sente respeitada. Conta com a remuneração fixa, contribui com a Previdência Social e pode fazer compras parceladas.Existe até gente jovem envolvida com a atividade. Anderson Macedo, de 27 anos, chegou a concluir o Ensino Médio. Se casou, teve dois filhos, mas nunca pensou em abandonar a cooperativa. Gostaria, sim, de fazer administração. Mas para trabalhar ali mesmo, no escritório. “Quem está aqui, acredita no projeto. Além de colaborar com a preservação ambiental, a cooperativa garante emprego e salário melhor aos trabalhadores”, fala. A Aliança, por sinal, é uma das cooperativas que vão ser modernizadas com recursos do BNDES. O repasse vai permitir a construção de um novo barracão no Jardim Mirassol, às margens da estrada do Jardim Campineiro.


PERFIL DOS CATADORES
Informações tabuladas por entrevistadores da Secretaria Municipal de Trabalho e Renda, com base em pesquisa por amostragem, elaborada a partir de questionários feitos em 18 pontos informais de coleta espalhados pela cidade de Campinas.
56% Dos catadores informais têm entre 39 e 60 anos de idade
4,5% Deles têm mais de 70 anos de idade
9,8% Dos entrevistados nasceram em Campinas
21,8% Nasceram em outros municípios paulistas
45.9% De todos os entrevistados informaram morar em Campinas há mais de dez anos
26,5% Vivem basicamente da atividade há pelo menos oito anos
32,3% Dos entrevistados estudaram só até a antiga 4ª série8,
3% Dos entrevistados disseram ser analfabetos
52,4% Dos catadores informais disseram nunca ter feito um curso profissionalizante
51,1% Optaram pela coleta quando perderam o emprego e não tinham outra forma de sobreviver
49,6% Não vivem sozinhos. Moram com parentes e colaboram com o orçamento doméstico
10,5% Dos catadores ganham, no máximo, R$ 100 mensais
43,6% Recebem entre R$ 101 e R$ 350 mensais
71,4% Dos catadores entrevistados afirmaram que concordariam em participar de cursos de qualificação profissional no setor.
(Fim do texto publicado no Jornal Correio Popular)




Flávio Luiz Sartori. flavioluiz.sartori@gmail.com

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